Este Ken já foi rockeiro: a breve carreira de Ryan Gosling no gothic rock
Written by Yasmin on 21 de janeiro de 2024
Não será nada surpreendente ver “I’m Just Ken” entre as canções originais indicadas ao Oscar 2024 na próxima terça-feira (23), quando a Academia revelar a lista oficial de candidatos à estatueta. Na verdade, antes mesmo de conquistar um prêmio no Critics Choice Awards, para a absoluta surpresa de Ryan Gosling, ou de atestarem sua chance na premiação com a lista de pré-selecionados, a balada já parecia ter sua vaga garantida. Afinal, em um ano com tantas canções originais marcantes, como “Peaches” e “What Was I Made For”, a faixa ganhou público e crítica, e até hoje é praticamente impossível ficar imune à sua melodia.
A música é a definição de chiclete e, quer você goste disso ou não, ela ainda está por toda a parte — até porque a dominação pink, embora seja coisa de 2023, continua na temporada de premiações, com a campanha de Barbie a todo o vapor. No entanto, mesmo que você cante a balada a contragosto, a performance de Gosling nessa canção e mesmo no cover de “Push”, do Matchbox Twenty, são memoráveis por um bom motivo. Mais do que encapsular o conceito da diretora Greta Gerwig de um mundo artificialmente autêntico com seu exagero e sua evidente sátira, elas são… bem, ótimas.
Não deveria ser tão chocante que Gosling tenha mais uma vez impressionado com seu talento, muito menos se tratando de música. Ainda que no primeiro momento seja fácil justificar sua destreza musical lembrando de títulos como La La Land e até O Novo Clube do Mickey Mouse, o ator tem uma afinidade verdadeira com o rock. Em 2009, muito antes de ser indicado ao Oscar pelo filme de Damien Chazelle, ele lançou um projeto peculiar: a banda de gothic rock, Dead Man ‘s Bones.
Ao lado de Zach Shields, ele apresentou um mundo habitado por monstros e fantasmas em um álbum conceito que poderia ser pretensioso, não fosse tão carismático. Talvez a razão para que esse tenha sido o resultado do primeiro e único disco da banda tenha a ver com a origem do projeto. Quando os dois se conheceram, Gosling namorando Rachel McAdams e Shields, a irmã dela, foi a paixão mútua pelo terror que os aproximou e, mais tarde, os levou a pegar novamente em instrumentos. Mas a intenção inicial deles não era sequer seguir carreira no rock: era, na verdade, montar um espetáculo musical — algo que estivesse mais alinhado aos moldes de uma produção escolar do que a qualquer peça que pudesse ir para a Broadway.
Essa despretensão, em parte motivada por experiências musicais anteriores frustrantes, injetou uma dose de novidade para a banda, que se manteve mesmo depois de abandonar o plano de ir para o teatro — por mais que seus membros quisessem frisar o caráter amador da produção, essa ainda era uma versão muito mais cara do Dead Man’s Bones que se concretizou. Se, por um lado, tanto Gosling, quanto Shields se propuseram a aprender a tocar instrumentos do zero — o primeiro ficou responsável pelo piano e o violoncelo, enquanto o último assumiu a bateria —, a adição de um coral infantil trouxe frescor às músicas.
Talvez, no primeiro momento, o combo crianças e canções sobre o sobrenatural soe estranho, mas este é um dos grandes trunfos do projeto — até porque os elementos de terror trabalhados pelo Dead Man ‘s Bones estão mais para uma festa de Halloween do que cenários de fato aterrorizantes. Mas, segundo Gosling, os jovens membros do Silverlake Conservatory of Music, coral de Los Angeles co-fundado pelo Flea, do Red Hot Chilli Peppers, não poderiam ter achado mais normal. Pelo contrário: “Não era estranho o suficiente”, afirmou à Pitchfork sobre a reação dos pequenos.
O duo sempre soube da efetividade dessa combinação — tanto que, originalmente, a ideia era que o vocal de todas as suas músicas ficasse a cargo de jovens cantores mesmo. “A gente nunca cantaria no disco”, relembrou Shields à Rolling Stone na época do lançamento do disco autointitulado. “Mas, quando estávamos trabalhando em partes dele, começamos a cantar e decidimos torná-las um dueto entre as crianças e nós”. A decisão foi acertada, porque parte do charme das músicas está no adorável contraste de vozes, assim como nas risadas espontâneas que vazam na melodia.
Ainda em 2009, os dois saíram em turnê pelos Estados Unidos e, por mais que Gosling não tenha parado com sua carreira como ator, até setembro de 2011 o interesse de lançar um novo disco era real. Infelizmente, o plano nunca saiu do papel — pior: o Dead Man’s Bones nunca mais voltou. Enquanto promovia Barbie no ano passado, Gosling não descartou um retorno. “Nunca diga nunca”, disse ao iHeartRadio Canada, visivelmente contente com a lembrança do projeto. Mas, hoje, parece até mais improvável.
Mesmo assim, seja exibindo toda a sua vulnerabilidade loira, seja construindo um universo particular adoravelmente gótico, como Ken ou músico indie, é fato que Ryan Gosling é dono de vários talentos — e ficamos na torcida para vê-lo cantar ao vivo no Oscar, em março.